Já ouviu falar no termo “economia prateada”? Muito discutido no SXSW, ele vem ganhando destaque nos últimos anos e refere-se ao conjunto de atividades econômicas voltadas para atender às necessidades e demandas da população com 50 anos ou mais. Também conhecido como economia da longevidade ou economia sênior, esse setor é crucial dado o envelhecimento da população no mundo.
Para contexto, no Brasil, 54 milhões de pessoas têm mais de 50 anos e formam um grupo que movimenta R$ 2 trilhões por ano, representando 23% do consumo de bens e serviços. E mais, para quem não sabe, a “economia prateada” é considerada a terceira maior atividade econômica do mundo, movimentando US$ 7,1 trilhões, anualmente. Ou seja, é essencial prestar atenção a essa faixa etária, que oferece inúmeras oportunidades de negócios.
Segundo Layla Vallias, cofundadora do Data8, um escritório de pesquisa pioneiro na Economia da Longevidade no Brasil, a América Latina é a região que mais envelhece no mundo. Ela enfatiza a urgência de entender quem são e o que desejam os latino-americanos com mais de 45 anos.
É importante frisar que a longevidade é uma das grandes conquistas da humanidade, refletindo avanços sociais e econômicos. No entanto, há pouca evidência de que os idosos de hoje estejam mais saudáveis que gerações anteriores, reforçando a necessidade de garantir que a população mais velha mantenha a capacidade funcional necessária para o bem-estar em idades avançadas.
E por que é tão importante motivar reflexões e ações nessa direção? Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), até o fim da década do Envelhecimento Saudável em 2030, o número de pessoas com mais de 60 anos aumentará 34%, chegando a 1,4 bilhão. Em 2050, essa população mais que dobrará, atingindo 2,1 bilhões. No Brasil, já há mais pessoas com 60 anos ou mais do que crianças abaixo de cinco anos, e em 2050, esses idosos superarão o número de jovens entre 15 e 24 anos, provavelmente deixando o Brasil em sexto lugar no ranking de país com a maior população com mais de 60 anos.
Com tantos dados comprovando a importância social e econômica desse grupo, fica difícil ignorá-los, né? Para Alexandre Kalache, maior referência do país, há 45 anos combatendo o idadismo e, hoje, aos 75 anos, reforçando que continuará a lutar pelos seus direitos até o fim, “a vida deixou de ser uma corrida de 100 metros – o marco final estava à vista. Tornou-se uma maratona – na qual não sabemos aonde vamos chegar.”
Infelizmente, o ageísmo, também conhecido como etarismo ou velhofobia, é um problema sério. De acordo com uma pesquisa da OMS de 2018, 6 em cada 10 pessoas têm opiniões negativas sobre a velhice. Os mais velhos são frequentemente vistos como menos competentes e como um fardo, em vez de serem valorizados por sua sabedoria e experiência. Anita Liberalesso Neri, psicóloga e pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas, destaca que os idosos internalizam essas atitudes discriminatórias, aceitando tratamentos desrespeitosos e paternalistas.
Quem aqui se lembra de Ashton Applewhite, que lá em 2008 decidiu deixar seu cabelo branco para desafiar estereótipos? Ashton quis mostrar que ter cabelos brancos poderia ser cool e sexy – quase prevendo que em 2020 a moda pegaria e ganharia capas de revistas. Para ela, o desejo de ter a cabeça branca naquele momento era confrontar o ageísmo internalizado, que ela ainda via em seus colegas de trabalho, amigos e familiares ao tomar a simples decisão de chocar o status quo que ainda diz que assumir os brancos é desleixo. Seu livro “This Chair Rocks” e sua palestra no TED explicam a origem do preconceito etário e como ele impacta desde o mercado de trabalho até a vida cotidiana. Applewhite tornou-se uma ativista contra o ageísmo e, aos 68 anos, lançou uma campanha global para mudar a percepção sobre a velhice, o “No Old School’, no qual você encontra ferramentas on-line, livros, blogs e artigos, campanhas, podcasts, palestras, vídeos e organizações pelo mundo.
Tudo isso só nos faz concluir que, se as pessoas mudaram, o cenário também deve mudar e o mundo precisa se adaptar às novas necessidades da população crescente que envelhece.
Traçando um paralelo com o excelente documentário da Netflix, “Blue Zones”, é evidente que a discriminação por idade contrasta fortemente com os ensinamentos dessas regiões. As Blue Zones são locais no mundo onde as pessoas vivem mais e com melhor qualidade de vida. Em lugares como Nicoya, na Costa Rica; Okinawa, no Japão; e Icária, na Grécia, é comum encontrar centenários ativos cuidando de seus jardins, cavalgando ou trabalhando. Nesses locais, os idosos são valorizados e integrados à comunidade, o que contribui para sua longevidade e bem-estar. Robert Waldinger, diretor do Harvard Study of Adult Development, destaca que bons relacionamentos são fundamentais para a felicidade e saúde na velhice. Não é apenas a quantidade de amigos, mas a qualidade das relações íntimas que importa – “bons relacionamentos nos mantêm mais felizes e saudáveis. Não é apenas o número de amigos que você têm, e não é se você está ou não em um relacionamento comprometido. É a qualidade de seus relacionamentos íntimos que importa”.
Tais lições mostram que combater o etarismo e criar ambientes mais acolhedores para os idosos pode ser um caminho para que todas as regiões alcancem níveis semelhantes de longevidade e qualidade de vida na terceira idade.
Quer se aprofundar ainda mais?
Pra ler: Dá uma lida no estudo completo!
Pra ouvir: episódio do podcast Café Brasil.
Dá o play: quem não se lembra da música de Arnaldo Antunes e Nando Reis, “Não vou me adaptar…”