Por Lidiane Queiroz de Oliveira
Dia 1 do maior evento de tecnologia do mundo, o Web Summit, em Lisboa. Depois de recolher a minha credencial como correspondente da Eat Your Nuts e ter o primeiro impacto da grandiosidade do evento (a edição bateu o recorde histórico de 71.528 participantes!), fui direto para a plateia da Meo Arena. O termo que mais ouvi? AI (Artificial Intelligence). E no dia 2? AI. No dia 3? AI. E no último dia? Bom, você já sabe: AI. Elon (Musk) e Trump completam as top 3 palavras que eu mais ouvi no palco principal.
É a primeira vez que dividimos o mundo com uma outra inteligência que é capaz de aprender, criar e transformar informações de maneiras que antes eram exclusivas dos seres humanos e é natural que em um evento de tecnologia esse seja o tema central. O que será que Steven Knight, criador de Quem Quer Ser um Milionário e Peaky Blinders, tem a dizer sobre isso?
“O problema é que, nas indústrias criativas, a IA é muito boa em fazer o que aprendizes fazem. Mas precisamos defender o processo de os seres humanos aprenderem e se desenvolverem.”
Pelos corredores das dezenas de pavilhões, cada participante tinha a sua agenda, provavelmente em torno dela, a AI: aprender sobre AI, palestrar sobre AI, investir em AI… e por aí vai. Em uma visita ao palco do AI Summit (claro que tinha um exclusivo!), você poderia ouvir Ali Albazaz falando sobre como produz romances milionários a cada três semanas na Inkitt. A startup combina dados e AI para descobrir novos talentos e desenvolver histórias que evoluem com base nas avaliações dos leitores. A experiência de leitura é hiperpersonalizada, permite que os usuários participem ativamente do processo criativo, ajudando a moldar narrativas, enquanto a IA identifica tendências e o potencial comercial nas obras.
Ok, uma plataforma que ajuda bons escritores a atingirem sucesso. Gostei! Mas peraí: obras hiperpersonalizadas? O que acontece com a cultura se passarmos a experienciar o mundo de formas cada vez mais individuais?
Sinto que preciso mudar um pouco de palco. Dou um check no aplicativo do evento, fico um pouco ansiosa com a quantidade de opções simultâneas e decido ir para o palco sobre criatividade. O termo mais ouvido?…
Print da minha agenda de um dos dias de web summit. Ainda bem que o evento disponibiliza links para o vídeo das talks e vou poder assistir tudo com calma.
Storytelling (narrativa)! E o segundo termo mais ouvido? Arte! E o terceiro: pessoas Ufa! Constanze Mitterhuemer, diretora de inovação do Museu Belvedere, em Viena, e Paul van Raak, diretor criativo da The Brand Father, contam como desenharam uma solução para atacar o maior desafio da instituição que completou 300 anos: atrair as crianças. Foi assim que nasceu The Fantastic Palastics, uma experiência gamificada criada a partir da história do museu. Fascinante, vale a pena assistir – e visitar!
Acho que encontrei meu palco favorito do evento. Além de tudo, o mediador, Gordon Young, é divertidíssimo e tem um sotaque escocês que eu adoro, que me lembra o do Paul Mescal. “Se eu sobreviver à maratona do Web Summit, quero ver Gladiador II no final de semana”, penso.
Ok, voltando. Em meio às anotações (aliás, sou uma das poucas com bloco e caneta), escrevo: “Are we f*cked?” (estamos ferrados?). A pergunta não é minha, é do próprio Gordon Young, para os líderes das principais agências criativas do mundo, como Karen Boswell, da VML. Segundo ela: “não! Os humanos não serão substituídos pela IA. Humanos com IA substituirão humanos sem IA. A tecnologia é impulsionada pelas necessidades e desejos humanos. A IA é criada por pessoas e para pessoas”.
Boa resposta, mas que boa pergunta! Talvez a mais espontânea e uma das poucas que não vi os convidados reformulando antes de responder. Um dos muitos exemplos:
Nicholas Thompson (CEO do The Atlantic):
Nós vamos perder o controle?
Max Tegmark (Professor do MIT e Presidente do Future of Life Institute):
Pergunta errada! Deveríamos estar perguntando: em que os humanos são melhores? O que queremos delegar para as máquinas? Estamos construindo isso, não precisamos competir. Por que faríamos isso? Olhe o que a espécie humana fez até hoje. Podemos construir um futuro incrível juntos.”
Diante de uma tecnologia tão nova e disruptiva, mesmo os melhores jornalistas e especialistas do mundo (e que curadoria de mediadores, aprendi tanto com eles quanto com os convidados!) ainda estão encontrando as perguntas. Isso torna o debate desafiador, traz respostas que muitas vezes mais abrem o tema do que amarram, soam muito otimistas ou muito apocalípticas, mas apontam para a mesma direção: a velocidade das mudanças só vai aumentar e em poucos anos a AI já estará tão integrada que nem será tema – como o que aconteceu com o termo Internet. O próximo hot topic? Provavelmente, robôs. Aliás, já viu o Optimus da Kim Kardashian?
E entre tantas boas perguntas, eu fico com a do Pharrel Williams, atração principal da abertura do evento em um papo sobre Cultura e Consumo ao lado de Frank Cooper, CMO da Visa: “Somos ensinados a perseguir o dinheiro. Isso está errado. Deveríamos perseguir fazer o que mais amamos. Se suas contas estivessem pagas, o que você faria? Construa sua vida em torno dessa paixão. Por exemplo: você ama futebol e é muito difícil ser jogador? Construa algo em torno disso. Você poderia ser treinador ou até mesmo desenhar os uniformes. Sonhe. É preciso uma colher de chá de ilusão, mas você precisa de convicção. Se não abraçarmos a nossa paixão, aquele fogo dentro da gente, estamos só ocupando espaço à toa no mundo”.