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Vagalumes digitais: o cinema na era do compartilhamento!

Em uma sala escura de cinema, durante a tão esperada sessão do musical Wicked, dezenas de celulares se acendem como vagalumes modernos. Não é só que atrapalham quem está ao redor – é como se estivessem redefinindo o que significa “ir ao cinema”. Esse fenômeno, que tem gerado acaloradas discussões entre cinéfilos e a geração TikTok, mostra o quanto a nossa forma de viver experiências culturais mudou.

Lembro de como era ir ao cinema nos anos 2000: um ritual quase sagrado. As luzes apagavam, os celulares eram desligados, e todo mundo se jogava no filme por duas horas. Simples assim. Mas, para a nova geração, parece que a experiência só fica completa depois de ser documentada e compartilhada. Enquanto uns veem isso como uma heresia, outros acham que é só a evolução natural da coisa toda.

O crítico de cinema Noah Gittell resumiu bem: “É como pedir para as pessoas não respirarem. É assim que elas enxergam o mundo.” Essa mudança não aconteceu do nada. É fruto de um mix de cultura digital e estratégias de marketing que transformaram a ida ao cinema em algo bem maior do que só assistir a um filme.

Curiosamente, a própria indústria do cinema tem alimentado essa revolução comportamental. Depois do baque da pandemia, os estúdios começaram a criar experiências cada vez mais “compartilháveis”: baldes de pipoca diferentões, sessões em 4DX que mais parecem um parque de diversões e campanhas de marketing que transformam qualquer estreia em um grande evento cultural que ninguém quer perder.

O fenômeno “Barbenheimer” do ano passado – quando “Barbie” e “Oppenheimer” foram lançados simultaneamente – exemplifica perfeitamente esta nova realidade. Sem nenhum plano oficial dos estúdios, o público criou espontaneamente um evento, vestindo-se de rosa para um filme e de preto para outro, compartilhando suas experiências nas redes sociais e transformando uma simples coincidência de datas de estreia em um momento cultural inesquecível.

O que está em jogo aqui não é só uma questão de etiqueta, mas de como as gerações se conectam com a arte. Para os puristas, o cinema é um templo, onde o mundo exterior não entra. Para os mais jovens, compartilhar é parte da experiência – não algo que vem depois, mas um elemento fundamental de como eles vivem e processam o que estão vendo.

Agora, não é porque a gente entende que vale tudo, né? Acender o flash no meio da sessão ou começar uma live no Instagram enquanto o filme rola já é demais. Talvez a saída esteja no meio-termo.

Como podemos resolver este impasse? Alguns cinemas já começaram a testar sessões “sociais”, onde celulares são permitidos, enquanto mantêm opções tradicionais para quem quer assistir sem distrações. Não é sobre impor regras antigas, mas pensar em novas possibilidades. Afinal, o cinema já mudou muito ao longo dos anos. Lá no início, o público aplaudia os heróis e vaiava os vilões – às vezes até jogavam coisas na tela! Esse silêncio quase religioso que conhecemos hoje nem sempre foi regra.

No final, a discussão não precisa ser sobre quem está certo ou errado. O desafio é manter o que o cinema tem de especial – o poder de nos transportar, nos emocionar e nos conectar – enquanto aceitamos que o mundo muda, e a forma como vivemos essas experiências também.

Como diz Bob Dylan, “Tudo passa, tudo muda, apenas faça o que você acha que deve fazer.” Talvez, no caso do cinema, isso signifique encontrar o equilíbrio entre celebrar a tradição e abraçar o futuro. Porque, no fim das contas, a magia do cinema é grande o suficiente para caber nas telas gigantes… e nas pequenas também.

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