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Casas burras? Vem entender o que são elas!

Em um mundo cada vez mais conectado, onde a tecnologia permeia praticamente todos os aspectos de nossas vidas, a ideia de simplificar o ambiente doméstico pode parecer contraintuitiva para muitos. No entanto, na nossa era saturada de informações, há um crescente número de pessoas a nadar contra a maré da casa inteligente, escolhendo casas que são, como disse o Financial Times em sua matéria fresquíssima, “burras”. Tais pessoas buscam uma vida mais simples e desconectada, especialmente dentro de suas próprias casas. Lendo a matéria “Why dumbing down your house could be a smart move”, do FT, e a recém publicada, “The anti-smart house, the latest status symbol in Silicon Valley”, na revista Town&Country, me fez querer trazer o tema pra discutirmos. Por que isso está acontecendo e por que deixar nossa casa mais simples pode ser, de fato, uma escolha inteligente?

Como uma entusiasta de mudanças e tecnologia – típico de uma aquariana, estou sempre de olho nas novidades e lançamentos de gadgets/tecnologias do mercado – e meu marido é igualzinho, senão pior. 

Por aqui, o quarto da nossa filha de apenas 9 meses tem, literalmente, 3 gadgets controlados pelo telefone – a luz/caixinha de música; a câmera do quarto e a câmera do berço, sem falar que quando ela nasceu ainda tinha o berço que era 100% inteligente e controlado por outro app. Loucura! E, na minha mais recente casa, tenho que confessar que me arrependo de ter aderido um sistema todo automatizado para cortinas, luzes, TV e som, controlado pelo smartphone. Se acaba a bateria do celular ou se quero ficar longe das notificações por um tempo, não tenho como mexer em nada disso. É isso ou aquilo. 

De fato, se pararmos para pensar, diante da constante estimulação digital, é fácil esquecermos que a nossa casa, muitas vezes, se torna o único refúgio onde podemos encontrar paz e tranquilidade. Só que isso só é possível se o ambiente em que vivemos permitir esse tipo de relaxamento. E é justamente com esse objetivo que reduzir o número de dispositivos eletrônicos –  além de minimizar a quantidade de decorações e manter os espaços limpos e organizados – pode criar um oásis de tranquilidade onde podemos escapar do frenesi do mundo exterior. 

Aliada a essa ideia, o artigo traz o conceito de Jomo, também em ascensão e ganhando cada vez mais adeptos – um sinal claro de que até mesmo os entusiastas da tecnologia estão começando a valorizar os benefícios de se desconectar ocasionalmente. Ao contrário da noção equivocada de que ficar sozinho é sinônimo de solidão, o Jomo nos encoraja a apreciar a riqueza que surge ao passarmos um tempo de qualidade com nós mesmos, o que está diretamente ligado ao crescente desejo de se afastar da tecnologia, uma tendência que se harmoniza com os movimentos de desintoxicação digital e busca pelo bem-estar.

Além disso, a discussão sobre a ideia da casa inteligente remonta a diversas obras da cultura pop, evoluindo ao longo das décadas, desde filmes como Sleeper (1973), de Woody Allen, até visões futurísticas da Microsoft, em 1999. E olha só, em 2012, o que antes era ficção, virou realidade: mais de 1,5 milhão de sistemas de automação residencial foram instalados só nos EUA e, em 2020, o mercado já valia uma fortuna: cerca de US$ 44 bilhões. É, a tecnologia realmente revolucionou o jogo e o modo como concebemos nossos lares.

E junto com essa revolução, a tendência de se afastar de lares altamente digitalizados acabou por ganhar força, com mais e mais pessoas conscientes dos impactos negativos de ficar grudado na tela o tempo todo, seja pela saúde ou pela dificuldade de separar trabalho e vida pessoal. E quem trabalha com tecnologia não está isento não, viu? Pelo contrário, são elas que estão cada vez mais cautelosas quanto aos efeitos da conectividade constante. Tudo isso mostra um valor maior pela calma e privacidade, deixando de lado aquela enxurrada de notificações e vigilância dos dispositivos digitais, com ênfase na promoção de um ambiente de vida mais equilibrado e tranquilo.

Portanto, mesmo que as chamadas “casas burras” não sejam definidas por uma única estética, todas elas representam uma recalibração mais ampla do relacionamento dos proprietários com a tecnologia. Há menos interesse nos aparelhos mais modernos e mais demanda por inovação consciente, especialmente nos campos da sustentabilidade, arquitetura verde e energia solar. 

Então, respondendo a pergunta lá do começo, simplificar a casa pode ser uma escolha inteligente por uma variedade de razões. Além de criar um ambiente mais tranquilo e propício para o relaxamento, isso pode nos ajudar a focar nas experiências e relacionamentos que realmente importam; reduzir o estresse e a ansiedade; estimular a criatividade e a produtividade, e promover a sustentabilidade. 

Para fim de conversa, comece a pensar que não é a casa burra o que nos ‘deixa burro” e, sim, o excesso de tecnologia, que nos faz esquecer o que é significativo e duradouro. Em vez disso, sua casa tem algo que a IA nunca terá: alma.

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