Hoje vou tentar explicar pra vocês o que está acontecendo entre a Ucrânia e a Rússia. Já adianto que o texto tá logo porque quis trazer uma riqueza maior de detalhes. Se não se interessar pelo tema, pula – quinta que vem tem mais, prometo! 🙂
Qual é a história por trás desse conflito?
A região que hoje é a Ucrânia, Rússia e a vizinha Belarus nasceu às margens do rio Dnieper, há quase 1.200 anos em Kievan Rus, uma superpotência medieval que incluía um enorme pedaço da Europa Oriental.
A Rússia se tornou politicamente um império, porém a Ucrânia não foi capaz de estabelecer um estado próprio e, no século XVII, grande parte de seu território se tornou parte do império russo.
Em dezembro de 1991, a Ucrânia, Rússia e Belarus assinaram um acordo que efetivamente dissolveu a União Soviética. Acontece que a Rússia estava ansiosa para manter sua influência na região e utilizou a recém-formada Comunidade de Estados Independentes (CEI) como ferramenta para atingir tal objetivo. Eles também pensavam que o fornecimento barato de gás manteria a Ucrânia em sua órbita, mas nem tudo saiu como planejado e, enquanto a Rússia e Belarus formaram uma estreita aliança, a Ucrânia se voltou cada vez mais para o Ocidente.
A Rússia percebeu, porém se mostrou despreocupada uma vez que, em sua visão, o Ocidente não tinha intenções de integrar a Ucrânia. Os russos estavam economicamente deprimidos e militarmente amarrados em suas guerras na Chechênia e, por isso, em 1997, ambos assinaram o Tratado de Amizade, Cooperação e Parceria, também conhecido como o “Grande Tratado”. Com este acordo, Moscou reconheceu as fronteiras oficiais da Ucrânia,incluindo a península da Crimeia, lar de uma maioria étnica russa.
Rupturas começam a aparecer na amizade
A primeira grande crise diplomática entre os dois lados ocorreu quando Vladimir Putin estava no poder. Em 2003, a Rússia começou inesperadamente a construir uma barragem no Estreito de Kerch, perto da ilha de Tuzla, na Ucrânia. O país viu isto como uma tentativa da Rússia de redesenhar as fronteiras nacionais e o conflito só foi resolvido após uma reunião presencial entre os dois presidentes, resultando na interrupção da construção da barragem.
Um pouco depois, as tensões se instalaram durante as eleições presidenciais de 2004, na Ucrânia, com Moscou jogando todo o seu peso atrás do candidato pró-Rússia, Viktor Yanukovych. A “Revolução Laranja” do país impediu que ele assumisse o cargo. A eleição foi declarada fraudulenta e o candidato pró-ocidental, Viktor Yushchenko, tornou-se presidente. Em resposta, a Rússia cortou o fornecimento de gás para a Ucrânia e para a União Europeia.
Como as coisas não correram tão bem como se esperava, a Ucrânia fez outra tentativa de fortalecer seus laços com o Ocidente com um acordo de associação com a UE. Mas no verão de 2013, poucos meses antes da assinatura oficial do documento, a Rússia jogou duro e exerceu uma enorme pressão econômica sobre Kiev, colocando um embargo aos produtos ucranianos que se dirigiam a Rússia, provocando protestos maciços da oposição em todo o país e forçando o governo de Yanukovych a colocar o acordo em gelo. Em fevereiro do ano seguinte, o presidente da Ucrânia fugiu para o território russo.
A anexação da Crimeia marca um ponto de virada
Putin tirou proveito do buraco no poder em Kiev e anexou a Crimeia em março de 2014. Esse foi o estopim nas relações entre os dois países e o início da guerra não declarada entre eles.
Pouco tempo depois, separatistas pró-Rússia nas regiões ucranianas de Donetsk e Luhansk declararam sua independência de Kiev, levando a meses de conflitos. A Rússia interveio militarmente e em grande escala, o que Moscou nega. O conflito terminou em setembro com a assinatura de um acordo de cessar-fogo em Minsk, intermediado pela França e pela Alemanha.
Como sabemos, de nada adiantou já que ocorreram repetidas violações do cessar-fogo. Para se ter ideia, a Organização das Nações Unidas (ONU) diz que houve mais de 3 mil mortes de civis relacionadas ao conflito no leste da Ucrânia desde março de 2014.
Qual a visão da Rússia?
Eles negam que planejam invadir a Ucrânia. Para Moscou, o crescente apoio da Otan à Ucrânia é sim considerado uma ameaça à própria segurança. Além disso, eles veem o aumento do número de tropas ucranianas como uma tentativa de retomar a região de Donbass, algo que o país nega.
Indo mais além, existe também uma preocupação sobre o aumento do poder bélico ucraniano patrocinado pela Otan. Para Putin, o envio de armas sofisticadas como sistemas de mísseis é visto como ‘cruzar a linha vermelha’ e, por isso, o presidente pede por acordos legais para impedir uma maior expansão da Otan em direção às fronteiras russas.
Qual a visão da Ucrânia?
Para o governo ucraniano, os russos não podem impedi-los de construir laços mais próximos com a Otan. Em sua visão, a Rússia tem a intenção de desestabilizar o país.
Dmytro Kuleba, ministro de Relações Exteriores da Ucrânia, avisou que um golpe poderia ser parte do plano russo anterior a uma invasão militar – “a pressão militar externa anda de mãos dadas com a desestabilização doméstica do país”, ele disse.
As tensões entre os dois países foram agravadas pela progressão da crise energética que Kiev acredita ter sido causada propositalmente pelos russos. Em paralelo, o país também sofre com um povo insatisfeito com o governo em meio a diversas polêmicas, incluindo uma terceira onda de infecções pela Covid-19 nas últimas semanas e uma economia desequilibrada.