Memoriais são locais para lembrança e luto coletivos, e também carregam consigo como se fosse uma espécie de carimbo que garante: isso aconteceu. Nós vivemos isso. Por décadas, a Alemanha se manteve em silêncio sobre o nazismo, depois, resolveu que a melhor forma de garantir que tais atrocidades nunca mais se repitam é falando sobre elas – e fez inúmeros memoriais para tornar o impensável, pensável. Já dizia o filósofo, George Santayana, “aqueles que não podem lembrar o passado estão condenados a repeti-lo”.
Normalmente, memoriais públicos são erguidos no coração das cidades – lugares de ação, movimento e vida – a fim de criarem uma tensão significativa entre a imobilidade de parar para lembrar e o movimento de continuar o dia. A ideia de memoriais é muito antiga – o Taj Mahal é um mausoléu; a Tumba de Grant e, tudo isso, reforça o verdadeiro significado da palavra ‘memorial’, que vem da palavra memorare em latim, a qual significa “recontar ou lembrar”. Assim, eles são retrospectivos, mas também aspiracionais: são declarações sobre quem lamentamos e prescrições de como lamentamos.
Já passei por muitos memoriais ao redor do mundo – Tel Aviv, Nova York, Londres, Berlim – e todos eles me emocionaram. O Memorial do 11 de setembro, concluído em 2011, me deixou impressionada – espelhos d’água construídos nas pegadas das torres do World Trade Center (os nomes dos mortos estão inscritos em bronze ao longo das bordas), com água caindo no vazio e criando um efeito que o arquiteto Michael Arad, um de seus co-designers, descreveu como “ausência tornada visível”. Em Tel Aviv, o Museu do Holocausto – o Yad Vashem – é das coisas mais lindas e emocionantes que já vi.
Memoriais podem ser efêmeros como o Santuário, criado este ano na Inglaterra, em homenagem às vítimas da Covid – uma obra de arte de quase 20 metros de altura feita em madeira com detalhes que pareciam uma renda – projetado pelo artista americano, David Best (famoso por seus templos no festival Burning Man). A ideia era queimá-lo até virar cinzas, como uma representação da beleza singular e fragilidade de um corpo humano.
Eles também podem evocar lembranças de outras perdas – como o mar de flores do lado de fora do Palácio de Kensington, em 1997, quando a princesa Diana nos deixou, ou mais recentemente, quando a Rainha Elizabeth II partiu. Memoriais podem ser ativistas – lembre-se dos muitos murais de George Floyd, em tantas cidades americanas (e até em outros países) que foram perturbadas pela violência policial.
Imagino que as vítimas da Covid-19 serão um dia homenageadas com um memorial físico, bem como todos os trabalhadores da linha de frente, cientistas, entregadores, funcionários públicos e todos aqueles que não podiam ficar em casa, porque seus empregos exigiam sua presença física. Nos EUA, o número de vítimas gira em torno de 1.055.000, mais do que qualquer guerra na história do país.
No Brasil, 690 mil vítimas até o momento que escrevo. Por aqui, já existe uma espécie de homenagem ‘online’ – o projeto artístico Memorial Inumeráveis vem escrevendo a história de vida de cada uma dessas milhares de vítimas da pandemia no país. A ideia é transformá-lo em um memorial físico.
Veja alguns dos memoriais mais famosos ao redor do mundo:
- Memorial Nacional pela Paz e Justiça – Alabama, EUA
- Memorial às Vítimas da Violência – Cidade do México, México
- Monumento Nacional do Holocausto – Ottawa, Canadá
- Memorial dos Soldados – Monte Herzl, Israel
- The New York AIDS Memorial – Nova York, EUA
- Memorial Steilneset – costa do Mar de Barents, Vardø, Noruega
- Memorial dos Judeus Mortos na Europa – Berlim, Alemanha