Meus pais sempre foram leitores assíduos. Eu cresci tendo estantes recheadas de livros em casa – e, de fato, lidos – não como objetos de decoração. Não tinha uma viagem para a praia no final de semana que, enquanto eu brincava com alguma amiga, eles não estivessem com livros nas mãos. Sempre estive rodeada por eles e frequentemente ouvi que o hábito da leitura poderia me levar ainda mais longe. Eles liam para mim, me davam livros, me cobravam quando não me viam por muitos dias perto de um … e tudo isso me leva a me perguntar por que algumas pessoas crescem tendo o prazer em ler, enquanto outras não?
Desenvolver o hábito da leitura não foi algo fácil e natural, apesar desse contexto todo. Na escola, tínhamos as listas de livros que deveriam ser lidos ao longo do ano letivo e, por conta de prova ou algum trabalho, os lia, mas no fundo muitas vezes não tinha prazer. Ou porque a temática não me interessava ou porque tal ato estava atrelado a uma obrigação. Para se ter ideia, os jovens e as crianças formam o maior grupo de leitores do país.
Conforme fui crescendo e amadurecendo, fui entendendo o tipo de leitura que gosto e fui encontrando histórias que me fazem esquecer de tudo e todos. Livros que me teletransportam para longe, que realmente me envolvem naquela história contada – e o que posso dizer disso? Nossa, é uma sensação muito prazerosa!
No meu círculo de amigos, sempre tive muitos que leem pouco. Independentemente da classe social, a internet, o vídeo game, a conversa, o brincar, qualquer coisa vinha e vem antes do livro. No Brasil, 44% da população não costuma ler e 30% nunca comprou um livro na vida. E para piorar, o país vem perdendo leitores a cada nova pesquisa. Segundo a 5ª edição do estudo “Retratos da leitura no Brasil”, feito pelo Instituto Pró-Livro em parceria com o Itaú Cultural e divulgado em setembro de 2020, foram 4,6 milhões de leitores perdidos em quatro anos, em uma queda puxada especialmente pelos mais ricos.
E por quê? Provavelmente, porque tais pessoas não criaram o hábito. Sim, ler é algo construído a partir do estímulo contínuo – que pode ser diário, semanal ou até mesmo mensal – da prática. Ou ainda, foram sucumbindo a era do imediatismo, às redes sociais, à nossa sociedade que cada vez tem menos paciência, deixando o hábito da leitura sofrer os impactos das centenas de distrações da vida cotidiana do século XXI. Foi-se o tempo das campanhas de incentivo à leitura – alô MTV e sua vinheta, “Desligue a TV e vá ler um livro”.
As pessoas estão tendo cada vez mais dificuldades em se concentrar e processar textos complexos e longos. É como se a habilidade de leitura se atrofiasse com o uso contínuo e ininterrupto do celular, explica a neurocientista cognitiva, Maryanne Wolf — em entrevista a BBC Brasil.
Voltando à pergunta do começo, sobre alguns terem prazer com a leitura e outros não, reflito sobre o “quanto os livros têm totalmente a ver com a educação, com fazer e manter novos leitores“. Crescer em uma casa que tem a cultura da leitura e como os pais criam seus filhos dentro dela é muito importante, tendo MUITO impacto no hábito da leitura futura de uma pessoa. Inclusive no livro, “Raising Kids Who Read”, Daniel Willingham explica três variáveis que têm muita influência sobre se alguém se torna um leitor para toda a vida (não entrarei em detalhes aqui, mas fica a dica).
Ler deve ser encarado por todos como uma rotina e um hábito igual ao de exercitar-se. A grande maioria não ama treinar, mas treina porque é preciso. É preciso criar resistência. Se esperarmos cair do céu o tempo livre para leitura, esperaremos para sempre. A gente é quem cria esse tempo em nossas vidas.
Para encerrar, recomendo muito o TEDxTalks do Pedro Pacifico aka @book.ster. Para quem não o conhece, em meados de 2017, ele criou o perfil no Instagram @book.ster, com o objetivo de dividir suas experiências com os livros e incentivar novos leitores. Atualmente, é criador de conteúdo e responsável pelo podcast “Daria um Livro”.