Sabe aquela famosa pergunta: ‘se você pudesse mudar uma coisa no seu corpo, o que você escolheria’? A minha resposta sempre foi altura. Não tenho nenhum problema com pessoas mais baixas, inclusive sou feliz com os meus 1,62 cm, mas se eu pudesse alterá-la facilmente, o faria. Os mais altos veem o mundo melhor – tenho inveja deles em shows de rock, as roupas caem melhor, eles são notados mais rapidamente, enfim, gosto de altura. Porém, parando para pensar, é curioso que a minha opção esteja justamente relacionada a algo que eu não posso mudar, ou pelo menos, era o que eu sempre achei.
Fiquei surpresa de saber que tem um número crescente de pessoas que estão se submetendo à cirurgia de alongamento das pernas – que pode custar até £ 80.000. Sério!!!!! Tal demanda é mais popular, principalmente, entre os homens jovens – os quais, querendo ou não, são os que sofrem maior preconceito. Muito disso está relacionado ao fato dos estigmas em torno das cirurgias cosméticas estarem desaparecendo para esse público – os procedimentos cosméticos masculinos aumentaram 29% em 2019, em relação às duas décadas anteriores, de acordo com a Sociedade Americana de Cirurgiões Plásticos.
A operação é impressionante e as técnicas e dispositivos variam. De forma resumida, enfia-se um prego depois de perfurar a cavidade muscular e, para tal, quebra-se intencionalmente o osso ao meio. Depois da operação, vem a parte inteligente: “Um dispositivo portátil posicionado contra a perna em casa cria um campo magnético que ativa um mecanismo de aparafusamento magnético dentro do prego, que é telescópico. A uma taxa típica de um milímetro por dia, espalhada por três ou quatro ativações de alguns minutos cada, a unha separa as duas seções do osso. O corpo produz novo tecido ósseo para preencher a lacuna crescente. Tudo isso dura várias semanas. Quando o alongamento estiver completo, a unha pode ser removida.”
De acordo com o cirurgião ortopédico, Dror Paley, pioneiro na Flórida e um dos especialistas em alongamento de membros mais experientes do mundo, o que motiva os cirurgiões a oferecerem tal procedimento é o dinheiro, e ainda afirma que o procedimento nem sempre acaba sendo bem feito e vira e mexe pacientes aparecem em seu consultório com complicações horríveis. Por outro lado, o grande motivador dos pacientes é o incômodo constante com preconceitos e senso de inferioridade.
O mais impressionante de tudo isso é o que o paciente se submete para alcançar o sonho da altura. Tende-se a passar um período de relativa imobilidade, às vezes necessitando de um período em cadeira de rodas e meses de fisioterapia, para ajudar os músculos a se adaptarem. Só consigo pensar no quão doloroso e demorado é o processo todo.
A altura talvez seja um dos últimos ‘preconceitos’ ainda aceitos em nossa sociedade.
Mas de onde tal preconceito vem?
De acordo com Dr Omer Kimhi, professor associado da Universidade de Haifa, Faculdade de Direito, ele tem raízes em preconceitos evolutivos, devido à importância da altura e da força no reino animal. “Se você é maior, você é o chefe do grupo. Parte disso permanece gravado… e percebemos a altura como ligada à autoridade, força e uma posição mais elevada”, diz ele.
Há também discriminação de altura na linguagem, repleta de expressões que enfatizam as virtudes de ser alto e associam qualidades negativas a baixa estatura. Por exemplo, “estar por baixo” significa “fracasso”, enquanto “estar por cima” significa “vitória”.
No ambiente de trabalho, pesquisas sobre discriminação sistêmica nas decisões de contratação mostraram que os empregadores podem rejeitar candidatos mais baixos, mesmo que seu currículo seja semelhante ao de um candidato mais alto, e subconscientemente associam traços positivos no local de trabalho, como confiança, competência e capacidade física, com altura. Uma vez contratado, a pesquisa mostra que as taxas de promoção estão positivamente relacionadas à altura.
Enfim, enquanto as pessoas ainda acreditarem que o sucesso e a liderança têm uma aparência específica, o problema não irá desaparecer. Combater a discriminação por altura será uma longa jornada, mas acho que o caminho não é se submetendo a essa cirurgia. Portanto, se eu encontrar alguém pensando em alongar as pernas, provavelmente vou tentar convencê-lo a pensar com cautela e lembrar de Winston Churchill.
Matérias fonte: BBC, The Guardian, FT