O que é o que é, está há muito mais tempo aqui do que nós, é a razão da sua existência, está em todo lugar, inclusive dentro de você, mas você não sabe ainda muito bem para que serve? Se você chutou os FANC: fungos alimentícios não convencionais, acertou! Hoje vamos falar sobre a crescente tendência em torno deles e como caçá-los para comer é uma realidade cada vez mais próxima de nós.
A importância dos fungos
Sem fungos, nós não teríamos pão, chocolate, queijo, molho de soja, cerveja ou vinho. Não teríamos plantas, animais e, portanto, não teríamos nós. Eles são responsáveis por quase toda a nossa produção de alimentos e pela maioria dos nossos materiais processados. E como eles se alimentam? Bom, eles têm filamentos que permitem que eles entrem em lugares que outros organismos não conseguem (são como as redes da internet moderna). Então, na verdade, os fungos vivem dentro de seus alimentos e secretam enzimas para dissolver os nutrientes que eles absorvem.
Tudo isso para dizer que quando as plantas fizeram a jornada evolutiva da água para a terra, os fungos serviram como seus sistemas de raízes por dezenas de milhões de anos até que as plantas pudessem desenvolver seus próprios. Sendo assim, eles fornecem nutrientes e água às plantas e elas fornecem aos fungos, açúcares da fotossíntese.
Então reforçando, um mundo sem fungos, seria um mundo sem florestas, já que a maioria das plantas não consegue viver fora da água e depende dos fungos para sobreviver.
E onde entram os FANCs nisso tudo?
A pandemia trouxe às pessoas uma consciência intensificada das cadeias de abastecimento de alimentos, amparada pelo medo da escassez, contaminação e acumulação. De repente, o interesse nos kits de cultivo de cogumelos simplesmente explodiu e certamente foi auxiliado pela trend do Instagram, transformando-os em uma obsessão da quarentena.
Matt McInnis, um dos fundadores da North Spore, empresa que visa tornar o mundo dos cogumelos acessível a todos, relatou que suas vendas de suprimentos para cultivo de cogumelos aumentaram 400% durante a pandemia. Antes, o que era visto como um hobby ou prática rural peculiar, ganhou popularidade no mundo online, fazendo surgir um novo tipo de consumidor, aquele interessado pelas conversas de auto sustentabilidade.
Sabemos que alimentar 7,9 bilhões de pessoas no mundo requer muita comida e que as mudanças climáticas estão ameaçando a agricultura e nossos frágeis sistemas alimentares. No reino fungi, são cerca de 1,5 milhão de espécies, sendo que existe um consenso entre os micologistas que acreditam que conhecemos, no máximo, apenas 10% da diversidade de espécies dentro do reino dos fungos.
Portanto, se os fungos têm um valor nutricional tão rico, é urgente aprofundar o conhecimento das espécies, saber identificá-las e preservá-las para isso se tornar subsídio de conservação, antes que elas se percam para sempre e, com elas, seu potencial. Afinal, as pessoas não vão cuidar e preservar algo que não sabem identificar bem como sua funcionalidade, não é mesmo?
‘Isso vai além de seu uso como material ou alimento: os fungos sustentam atividades culturalmente importantes para comunidades rurais em todo o mundo. Milhares de famílias que vivem em economias de subsistência dependem do aparecimento sazonal de fungos como alimento e como um produto comercializável a ser consumido localmente, nacionalmente e internacionalmente.’
Com esse objetivo, o biólogo Jeferson Müller Timm, publicou o livro ‘Primavera Fungi – Guia de Fundos do Sul do Brasil‘, apresentando de forma didática 154 espécies de fundos em imagens detalhadas com indicação sobre comestibilidade, locais de ocorrência e época do ano em que podem ser encontrados.
Outro material interessante, é o documentário Fantastic Fungi, dirigido por Louie Schwartzberg e disponível na Netflix. Visando trazer consciência, o filme nos leva a uma viagem imersiva no tempo e na escala das substâncias e terra mágica sob nossos pés, que pode curar e salvar nosso planeta. ‘Através dos olhos de renomados cientistas e micologistas como Paul Stamets, autores de best-sellers Michael Pollan, Eugenia Bone, Andrew Weil e outros, nos tornamos cientes da beleza, inteligência e soluções que o reino dos fungos nos oferece em resposta a alguns de nossos desafios médicos, terapêuticos e ambientais.’
Uma aposta da gastronomia do futuro, cheia de potências nutritivas
A saúde e o meio ambiente não são os únicos que impulsionam o consumo dos cogumelos. A gastronomia também tem forte papel nisso.
Os humanos comem cogumelos há milhares de anos e há cerca de 2 mil espécies comestíveis, sendo apenas 25 cultivadas comercialmente. Dentre as mais comuns estão: champignon, cogumelos brancos, portobello, shiitake, shimeji, cremini e ostra. Geralmente pobres em calorias, carboidratos e gordura, são ricos em nutrientes essenciais e comumente uma fonte com alto teor de proteína, considerados uma alternativa saudável e sustentável à carne.
Transformar fungos em proteínas não é novidade, mas essa tendência vem ganhando cada vez mais destaque no mundo das startups e investimentos.
Em 2020, a indústria de proteínas alternativas arrecadou US$ 3,1 bilhões em investimentos, três vezes mais do que em 2019. Com o aumento do financiamento, vem uma maior variedade de opções novas e inovadoras e, embora as pessoas tendam a usar o termo “à base de plantas” para abranger todas as proteínas alternativas, essa frase é limitante, pois ela não cobre todo o espectro de alimentos livres de animais que podem ser baseadas em fungos, vegetais, cultivadas em laboratório, baseadas em algas ou proteínas de inseto.
Uma empresa exemplo disso que encontrei e fiquei encantada é a Nature’s Fynd, com sede em Chicago e que levantou US$ 158 milhões em financiamento de investidores, incluindo Bezos, Gates e Al Gore. A startup produz hambúrgueres sem carne e cream cheese sem leite através da proteína nutricional de fungo Fy ™, que tem origem em uma fonte termal vulcânica no Parque Nacional de Yellowstone.
Além da crescente população de veganos e o movimento de cultivo de sua própria comida, os chefs estão usando mais cogumelos gourmet. Em São Paulo, o chef de cozinha Leo Botto que fechou seu restaurante Boto durante a pandemia, passou a caçar cogumelos no Pacaembu, ao lado do estádio. Só que identificar cogumelos, contudo, é tarefa para quem entende e estuda a respeito, porque são muitas as espécies tóxicas e ingeri-las pode ser letal. Por isso, o chef cercou-se de especialistas.
Mais sobre o mundo dos cogumelos na saúde, no business e na alimentação:
- ‘Em breve teremos o uso de psicodélicos aprovados na psiquiatria’, afirma o maior especialista do país.
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